(Uma pequena catequese litúrgica)
Nossas celebrações eucarísticas não são estáticas, mas dinâmicas pela sua própria natureza, uma vez que celebramos sempre o Mistério Pascal vivo de nosso Deus. Podemos falar então de movimentos em que se realizam os ritos. Por isso penso ser útil sabermos em que dimensão nós nos encontramos nos diversos momentos dos ritos celebrativos.
Vejamos: com relação por exemplo a audição, ora é Deus que nos fala, mas servindo-se dos ministros da Palavra, ora somos nós que falamos a Deus, diretamente na voz da assembleia, em sua participação ativa, como também na voz viva do presidente da celebração, como voz, porém, da Igreja. O que aqui se diz poderá então nos ajudar a participar melhor e cultivarmos a atenção sempre pedida na celebração. Por exemplo: na liturgia da Palavra podemos estar distraídos enquanto Deus nos fala, sem darmos atenção ao "Ouve, Israel..." da exortação bíblica (Cf. Dt 6,4). Expliquemos mais: a nossa condição humana nos leva a perceber simplesmente a voz humana dos ministros, sem nos darmos conta de que, na verdade, é o Senhor que nos fala por meio deles, conforme nos ensina o Concílio Vaticano II (SC 7a). Podemos então perceber a dimensão ou direção nos diversos momentos celebrativos, e isto facilita a nossa participação. Ei-las:
DIMENSÃO DESCENDENTE (↓) = Deus nos fala. DIMENSÃO ASCENDENTE (↑)= Nós falamos a Deus. Podemos falar ainda de DIMENSÃO HORIZONTAL (→) = Movimento que aponta para a vida, para a prática da comunhão fraterna, ou seja, a vivência no cotidiano.
I - RITOS INICIAIS
Na missa têm o caráter de exórdio, introdução e preparação da celebração. Estes ritos são: A procissão de entrada do sacerdote e dos ministros - A saudação do presidente - O Ato Penitencial = “Senhor, tende piedade”, ou Kyrie - O hino do Glória e a Oração do dia.
Nesses ritos iniciais predomina a dimensão ascendente, mas é bom sabermos desde o início que a nossa reunião é iniciativa de Deus. De fato, Ele é que nos convoca para nos reunirmos em sentido eclesiológico, isto é, como povo de Deus, a sua Igreja. Em síntese: O Senhor nos chama para ouvirmos a sua palavra e celebrarmos a Eucaristia, numa verdadeira liturgia ritual.
II - LITURGIA DA PALAVRA
Nessa parte da celebração predomina a comunicação descendente, pois é Deus que nos fala através de ministros, e nossos ouvidos ouvem, em escuta receptiva, como nos diz Cesare Giraudo.
O salmo responsorial é prolongamento lírico, poético e meditativo da primeira leitura, palavra divina que tomamos “emprestado” da Escritura para tornar mais viva a nossa resposta à Palavra de Deus. Assim, porque é resposta nossa, podemos considerar o salmo responsorial na dimensão ascendente, dimensão que vai aplicar-se também à aclamação do evangelho. Já a homilia pode apresentar-se com tríplice dimensão: descendente, enquanto Palavra divina, proclamada e iluminada, palavra portanto que vem do alto; ascendente, exigindo do homiliasta a reflexão necessária e a devida preparação, em atitude silenciosa, mediante, pois, a iluminação do Espírito Santo; e, finalmente, a dimensão horizontal, em que o homiliasta, no exercício de seu ministério, deverá tornar a palavra de Deus acolhida pela comunidade celebrante, isto necessariamente no contexto atual desta, a fim de que ela possa vivê-la no seu dia a dia, tornando a vida “sacrifício vivo e culto espiritual a Deus” (Cf. Rm 12,1).
Fazem parte da Liturgia da Palavra: A 1ª Leitura - O Salmo responsorial - A 2ª Leitura - A Aclamação ao evangelho - O anúncio do Evangelho - A homilia - A profissão de fé e a Oração dos fiéis, esta chamada também de Oração Universal ou comunitária.
A profissão de fé aqui é de caráter eclesial, pois a fé que se processa na celebração é a fé da Igreja, e a Oração dos fiéis deve ser instruída pela Palavra divina, e não ser meros pedidos de espiritualidade intimista, como ainda desconexos que apresentamos a Deus. De acordo com a Liturgia, na Oração dos fiéis sempre deve haver a súplica pela Igreja e pelo Santo Papa, tomando corpo também, é claro, as necessidades da comunidade reunida.
III - LITURGIA EUCARÍSTICA
Diferente da Liturgia da Palavra, aqui predomina a dimensão ascendente. Inicia-se com o rito das oferendas, o qual é desenvolvido em três momentos: 1) - a procissão dos dons, que deve ser feita por membros da assembleia, 2) - a sua preparação, pelo diácono ou presidente, e 3) - a sua apresentação pelo presbítero ou bispo. Colocando no altar nossos dons e nossa vida, pelo sacerdote (voz comum da Igreja) elevamos a Deus a Oração Eucarística, com a riqueza de seus elementos literários e teológicos. Nossos ouvidos materialmente ouvem essa oração, mas é nossa boca que, pela voz do sacerdote, voz da Igreja, teologicamente, a recita, nas palavras também de Cesare Giraudo. Com relação a nós, trata-se então aqui de “escuta ativa”, diferente, pois, daquela da Liturgia da Palavra, que chamamos de “escuta receptiva”.
ORAÇÃO EUCARÍSTICA
São nove os elementos literários, litúrgicos e teológicos da Oração Eucarística: 1) - O Prefácio - 2) - O Santo - 3) O Pós-Santo - 4) - A 1ª Epiclese (invocação do Espírito Santo sobre os dons) - 5) - A narrativa da instituição (ou Consagração) - 6) - A anamnese (memorial-ofertório) - 7) - A 2ª epiclese (invocação sobre os comungantes) - 8) - As intercessões e 9) - A Doxologia final com o Amém ratificante da assembleia.
IV - RITOS DA COMUNHÃO
Podemos dizer que predomina aqui a dimensão ascendente, mas em resposta à nossa Oração Eucarística, Deus nos dá o Pão do Céu, ou seja, o Corpo e o Sangue do Senhor (dimensão descendente) e, com os ritos próprios da Comunhão, recebemos o Corpo sacramental de Cristo nos sinais visíveis do pão e do vinho, formando o seu corpo eclesial e místico.
Fazem parte dos ritos da Comunhão: A oração do Pai Nosso, com seu embolismo (continuação) - A Oração pela paz - A saudação da paz - O rito da Fração do pão - A Comunhão sacramental de todos os participantes - O momento de silêncio e de louvor, se oportuno - A Oração após a comunhão.
V - RITOS FINAIS
Sentido eclesiológico: Somos enviados em missão → Liturgia da vida e do cotidiano
Avisos - Bênção final - Despedida (Dimensão horizontal)
Como nos ritos iniciais, também nos ritos finais, descritos acima, verifica-se a dimensão eclesiológica, na dimensão horizontal, pois nós, como assembleia celebrante, tendo participado da Mesa da Palavra e da Mesa do Pão, somos finalmente enviados ao mundo, para, no dia a dia de nossa vida, nele fazermos presente o Reino de Deus, num testemunho vivo de discípulos de Cristo. Passamos então da liturgia ritual para a liturgia da vida ou existencial.
João de Araújo