Em minha vida, Senhor, sempre me falaram de ti. Muito me disseram a teu respeito.
Fiquei sabendo
que sofreste muito,
que foste ultrajado,
que zombaram de ti.
Pelo bem que fizeste, ganhaste uma coroa de espinhos.
Puseram de lado as tuas lições de vida. O teu jeito sereno de amar.
As sedições de Barrabás falaram mais alto. Foram mais atraentes.
Como não eras um competidor, perdeste pontos para um anarquista. Em todos os tribunais. Na opinião dos jurados. E também do auditório. Até Pedro – que mentiria depois para uma empregada – ousou dar-te conselho.
Fizeram-te, finalmente, uma cruz. Sob medida. E nela morreste.
Exultavas, porém, na eterna contemplação do Pai, embora com os pés num mundo, palco de exterioridades e de mentiras.
Sabes, Senhor, eu pensei em mudar um pouco a tua história.
Achava-a trágica demais para contar aos filhos, netos e bisnetos.
Um colorido mais suave não lhe faria mal. Afinal, o passado não volta. E o teu foi bem sepultado. Não te lembras? Foi colocada uma grande pedra sobre o teu túmulo!
Eis, pois, o meu sonho: encontrar-te no outro lado da vida.
Sem cruz, sem espinhos, sem dores, sem dramas.
Uma vida de Tabor, e não de Calvário.
E palmilhei então longos caminhos. Como outros, subi também montanhas e avistei mil prados. Contemplei horizontes mais límpidos e céus mais fulgurantes. Mas, confesso: nem a sinfonia cósmica, tão excelsa e pura, me trazia as notas que eu tanto sonhava.
Tudo, pois, em vão!
Encontrei gente chorando,
gente sofrendo,
gente sorrindo
e gente lutando,
Mas não te encontrei.
Para confundir-me ainda mais, uma força estranha me puxava, à medida em que eu me dispunha a caminhar mais.
Foi então, Senhor, que me abriste os olhos e me alertaste de que,
na caminhada dos homens,
estás em agonia até o fim dos tempos.
Em cada pessoa que nasce, vive, sofre, sonha e aspira.
Percebi, pois, quão grande era a minha tolice.
Jamais te encontraria por caminhos que não fossem os do Pai.
E que de fato estavas em todo semblante que eu via.
Compreendi que, na história humana, não te separas da Cruz.
Finalmente, Senhor, percebi também que estavas comigo.
Mesmo na loucura de minha caminhada.
E foi tua presença amiga que me salvou.
Pois eu corria o risco de querer também uma vida sem cruz.
E acabaria certamente encontrando uma cruz sem ti.
E isto seria meu grande fracasso!