A caridade, segundo São Paulo (Cf. 1Cor 13)

1 - Nossa vida cristã, no ensinamento de São Paulo, pode estar repleta de gestos, de palavras, de pensamentos e de comportamentos, tidos por nós e pelos outros como práticas da caridade e como sublimação do viver cristão. Contudo, pode faltar-lhes aquele algo que caracteriza tais atos como caridade em sentido pleno, que é o amor a Deus e de Deus, pois Deus é amor, é a caridade personificada.

2 - Então podemos falar a língua dos anjos e dos anjos, podemos ter o dom da profecia, o conhecimento de todos os mistérios e de toda a ciência, podemos ter toda a fé, mas, sem a caridade, nada seríamos. Podemos, é verdade, distribuir ainda todos os nossos bens para o sustento dos pobres e chegar ao heroísmo de entregar nossos corpos às chamas. Sim, podemos fazer tudo isso, mas se não tivermos a caridade, isto é, se não tivermos o amor de Deus presente em nós, o seu Dom maior, que é Cristo, então tudo isso poderemos fazer como mera projeção de nosso eu, em atitude, pois, simplesmente egoísta, como ensina também Santo Agostinho.

3 - Somos chamados então a rever as nossas ações, nossos pensamentos e nossa vida à luz da Palavra de Deus, vendo, pois, em todos aqueles irmãos que se beneficiam com nossa prática cristã não meros carentes de nossa compaixão e de nossa solicitude fraterna, mas vendo neles, sim, antes de tudo a presença do Deus amoroso, do Cristo ainda padecente, que, no pobre, no aflito, no excluído e perseguido, continua ainda a sua viva Paixão.

4 - A caridade, segundo o ensinamento paulino (cf. 1Cor 13), nos é apresentada então com três particularidades: sua superioridade, afirmada nos versículos 1-3 “se não tivesse a caridade...”); suas obras inconfundíveis, não abstratas, mas concretas, afirmadas nos vv. 4-7, (a caridade é paciente, prestativa, não invejosa, não exibicionista, sem inchar-se de orgulho, nada faz de inconveniente, não busca seu próprio interesse, não cultiva a irritação, nem guarda rancor, não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade. Além disso, tudo desculpa, tudo crê, tudo espera e tudo suporta). E, finalmente, a sua perenidade, vivamente expressa no versículo 8a, com a síntese: “a caridade jamais passará”, em oposição às profecias, às línguas, à ciência e toda forma de conhecimento, que, por serem limitados e relativos, um dia desaparecerão (cf. vv. 8b-10).

5 - Notemos que São Paulo, no versículo12, repete duas vezes a palavra “agora”, não só referindo-se ao momento presente dos cristãos de Corinto, (os quais davam importância exagerada aos carismas, como se vê nos vv 1-3), mas também à incapacidade de no presente verem “face a face”, como também de terem conhecimento pleno. O “depois”, duplo, do mesmo versículo, tem sentido escatológico, apontando para a realização plena no projeto de Deus, tanto no “ver face a face”, sem mediações, quanto na capacidade de “conhecermos como somos conhecidos” por Deus-Pai.

6 - O versículo 13, por sua vez, vai afirmar a permanência das virtudes teologais (Fé, Esperança e Caridade), colocando a caridade como a virtude por excelência e perene. Na plenitude da vida eterna, podemos dizer que as virtudes da fé e da esperança não vão simplesmente “desaparecer”, mas serão como que “absorvidas” pela caridade, esta na identificação profunda do amor de Deus. Digamos então que a fé, dom de Deus que nos vem pelo Batismo, já estará de posse do bem supremo que aqui só se pode saborear e contemplar, e que a esperança já encontrou no horizonte de Deus o que antes esperava. Em nossa peregrinação terrestre, portanto, “agora”, só podemos ver “como em espelho”, imperfeitamente e de maneira confusa, mas, “depois”, isto é, na vida da bem-aventurança eterna, “veremos face a face”, como Deus nos vê, com seu amor sem limites e sempre apaixonado por nós.



João de Araújo

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