01 - A Eucaristia faz da Igreja um corpo vivo e místico, como sinal referencial de salvação, um sacramento visível da unidade salvífica (cf. LG n. 1 e 3), concretizando o projeto amoroso de Deus em seu Filho. Assim, a assembléia litúrgica não é mera aglomeração ou associação de pessoas, reunidas para um determinado fim. "A Igreja faz a Eucaristia, mas a Eucaristia também faz a Igreja”, na formulação teológica de Henri de Lubac, um dos padres consultores do Concílio Vaticano II. Aqui, pode-se afirmar que a Igreja é plenamente eucarística, como também é plena a dimensão eclesiológica da Eucaristia.
02 – A Eucaristia torna real a comunhão dos santos, em sentido profundo, nas três dimensões possíveis de visualização da Igreja: Igreja peregrina, em marcha ainda no tempo; Igreja gloriosa, já no gozo eterno dos bem-aventurados; e Igreja também padecente, cujos membros ainda se purificam antes da posse definitiva da felicidade eterna. A Igreja, pois, que celebra a Eucaristia é, ao mesmo tempo, terrestre e celeste, em sua unidade misteriosa. Aqui então devemos falar mais uma vez da importância da aclamação do Santo (Sanctus), como voz comum e única de todos os eleitos, tanto dos já bem-aventurados como dos que ainda peregrinam rumo à casa do Pai.
03 – Pela ação sacerdotal de Cristo na sua Igreja, a Eucaristia perpetua o sacrifício da cruz, como afirma o Concílio Vaticano II (SC n. 47; LG n. 3), realizando assim, de maneira contínua, a obra da redenção. Pela Liturgia, mas sobretudo pela Eucaristia, os atos redentores de Deus se tornam contemporâneos nossos, um mistério cada vez mais sublime e inexplicável pela razão humana.
04 - Em linguagem litúrgica e teológica, a Eucaristia é prelibação do banquete celeste, quer dizer, aqueles que a celebram nos dias desta vida já antecipam a glória eterna, que um dia celebrarão, na liturgia celeste, com o Cristo glorioso. Nesta compreensão, ela é memória da páscoa primeira, anúncio e profecia da páscoa futura, como também antecipação, no “hoje celebrativo”, da páscoa definitiva e eterna.
05 - A Eucaristia é fonte perene de vida da Igreja e ápice da vida cristã. A ela se ordenam, pois, todos os ministérios, sendo sua celebração o ponto mais alto da Liturgia. Em outras palavras, a Eucaristia plenifica a vida cristã, dotando-a do espírito missionário, evangelizador, catequético e libertador, como se vê no Evangelho e nas orações litúrgicas (Eucologia).
06 - Todo o bem espiritual da Igreja encontra-se na Eucaristia, uma vez que ela não nos dá somente o dom da graça, mas o próprio autor da graça, Cristo. Cristo, e somente Cristo, é a graça essencial de Deus. Ele se nos dá na Eucaristia, para que nos transformemos nele, cristificando-nos. “Não sou eu que me transformo em ti, como os alimentos naturais, mas tu é que te transformas em mim”, pode Cristo dizer-nos na Comunhão, conforme ensina Santo Agostinho. Em outras palavras: o alimento terrestre confirma que somos terrestres, e o alimento celeste afirma que, com Cristo, somos celestes e já estamos na eternidade de Deus.
07 - Na Eucaristia, que é sempre celebração do Mistério Pascal de Cristo, somos chamados às coisas elevadas, numa verdadeira passagem: do humano para o divino; do presente para o futuro; do tempo para a eternidade; do visível para o invisível; da instabilidade do mundo para o reino eterno do amor e da vida. Na sua realidade pascal, a Eucaristia celebra a passagem de Cristo da morte para a vida, o mesmo já acontecendo com todos nós que a celebramos.
08 - A Eucaristia alimenta a caridade, o sentido de fraternidade, o senso de justiça e todos os demais valores da vida humana, orientando-os para a glória de Deus, com efeitos eficazes na dupla dimensão da vida humana: na linha vertical, tendo em vista o mandamento primeiro de amar a Deus sobre todas as coisas, glorificando-O; e na linha horizontal, como consequência, o honroso dever de amar os irmãos, como filhos do mesmo Pai, servindo-os concretamente numa vida plenamente solidária e de comunhão. Nas duas linhas (vertical e horizontal), podemos viver a experiência da cruz, no seguimento então de Jesus Cristo.
09 - Em toda celebração eucarística, de maneira invisível, mas real, Cristo continua “lavando os nossos pés”, como apelo fortíssimo para que nós façamos o mesmo, isto é, amemos uns aos outros na medida de seu amor. Assim, o gesto e o apelo do Cenáculo continuam vivos em nossas celebrações.
10 – Precisamos saber que a Eucaristia é de valor infinito, mas sua eficácia é limitada, pois esta depende das disposições de cada fiel. Quanto a isso, diz o Concílio Vaticano II: “Para que se obtenha esta plena eficácia, é necessário que os fiéis se acerquem da Sagrada Liturgia com disposições de reta intenção, sintonizem a sua alma com as palavras e cooperem com a graça divina, a fim de que não a recebam em vão” (cf. SC n. 11). Aqui valem as considerações acima, de ordem vivencial, para o nosso cotidiano. Então, é desejável e necessária também a espiritualidade litúrgica não só dos ministros, mas de todos os fiéis, para que a sua participação seja sempre consciente e alcance o grau máximo na santificação eucarística.
11 - Celebrando a Mistério Pascal de Cristo em sua plenitude, a Eucaristia deve ser vista no âmbito do Ano Litúrgico como o seu momento maior. Na páscoa semanal do domingo ela derrama para toda a semana a sua vitalidade salvífica e pascal e, na páscoa anual, derrama para todo o Ano Litúrgico a sua mesma eficácia redentora.
12 - Na linguagem dos Santos Padres, a Eucaristia é “o sacramento dos sacramentos”, isto porque também todos os sacramentos se convergem para a Eucaristia, encontrando nela a sua realização mais profunda. A Eucaristia é como um sol fulgurante, que derrama seus raios vitais para todo o mundo criado, devolvendo a ele a grandeza inicial do projeto divino, que foi embaçada e ferida pelo pecado. No pão e no vinho, como frutos da terra e do trabalho humano, eucaristizados, já podemos contemplar a cristificação iniciada de todo o universo e da história humana.
João de Araújo