1 - Na última ceia, por ocasião da instituição da Eucaristia, Cristo partiu o pão e o deu a seus discípulos. Este gesto do Senhor é carregado de sentido. Significa que os fiéis, participando pela comunhão no único pão da vida, que é Cristo, morto e ressuscitado, formam um só corpo, o corpo eclesial de Cristo, a Igreja (cf.1Cor 10,17). Aqui então o sentido eclesiológico do rito. E a Instrução diz: “O sacerdote parte o pão e coloca uma parte da hóstia no cálice, para significar a unidade do Corpo e Sangue do Senhor na obra da salvação, ou seja, do Corpo vivente e glorioso de Cristo Jesus” (cf. IGMR nº 83). Vemos então aqui o sentido também cristológico da “Fração do pão”. Este rito se chama imisção.
2 - Notemos que o próprio gesto da fração do pão deu inicialmente o nome à missa. Assim, a celebração dos primeiros cristãos chamava-se, inicialmente,"Fração do Pão" e, depois, "Ceia do Senhor". Hoje, o nome mais apropriado para a nossa celebração pascal é “Eucaristia”, que significa ação de graças. O rito da “fração do pão” constitui o terceiro gesto de Jesus no Cenáculo: “Ele partiu o pão...”
3 - Uma constatação: Cristo quis ser nosso alimento e fez do pão e do vinho sinais visíveis e sacramentais de sua presença. Assim, a Instrução do Missal vai dizer que “a verdade do sinal exige que a matéria da celebração eucarística pareça realmente um alimento”. Devemos notar contudo que as nossas hóstias guardam pouca semelhança com o pão verdadeiro. Por causa do sentido de participação de todos no mesmo pão, que seria o ideal, o Missal propõe que “o pão eucarístico seja de tal modo preparado que o sacerdote, na missa com o povo, possa de fato partir a hóstia em diversas partes e distribuí-las pelo menos a alguns fiéis”.
4 - Seria bom ainda considerar o seguinte: “o partir o pão” não tem sentido prático, como o das nossas casas. Seu sentido é simbólico. Como se falou acima, participando de um único pão, que é o Corpo sacramental de Cristo, tornamo-nos um único corpo, o seu corpo eclesial e místico, a Igreja. Consequentemente, o gesto da “fração do pão” nos leva à descoberta em nossa vida do sentido da fraternidade, de verdadeira partilha, sobretudo com relação aos nossos irmãos mais pobres.
5 - Dado o sentido litúrgico desse rito, podemos então dizer, sem hesitação, que a “mesa dos pobres” não ficaria sem o pão de cada dia se tivéssemos uma compreensão mais profunda da “mesa eucarística”. Digamos ainda que a “mesa eucarística” é a mais verdadeira de todas, porque seus comensais são tratados sem distinção, na igualdade de filhos de Deus, com a marca comum da dignidade batismal.
6 - Na liturgia, o gesto da fração do pão, rito que é reservado ao sacerdote e ao diácono, vem acompanhado do canto do "Cordeiro de Deus", que é um canto litânico, isto é, em forma de ladainha. Esse rito é próprio da missa, portanto não faz parte das Celebrações da Palavra. Enquanto o sacerdote parte o pão e coloca uma pequena parte no cálice, a assembleia entoa, geralmente por três vezes, o "Agnus Dei" ou "Cordeiro de Deus", suplicando a misericórdia e, na última vez, pedindo a paz. Pode acontecer - e isto acontece realmente, quando não há critério litúrgico - que o canto do abraço da paz (que é canto suplementar, e por isso não tem tanta importância) acabe "sufocando" este rito da fração do pão, em prejuízo da Liturgia.
7 - A Instrução Geral sobre o Missal Romano prevê que as intenções litânicas do Cordeiro de Deus sejam tantas quantas necessárias para a duração do rito da Fração do Pão e não somente três, o que pode acontecer em concelebrações com muitos bispos e sacerdotes, mas na prática quase não acontece. A mesma Instrução aponta, aliás, para o não prolongamento desnecessário desse rito. Para a última intenção litânica, prescreve-se sempre o “dai-nos a paz”.
8 - Uma observação: Alguns sacerdotes, entendendo e aplicando em sentido literal o “partiu o pão” da narrativa eucarística, já na Consagração partem a hóstia. Mas não é correto fazê-lo. O verdadeiro momento da “fração do pão”, liturgicamente, é como acima indicado e depois do Pai Nosso. Uma nota que esclarece mais: se fosse correto partir a hóstia na Consagração (porque lá diz “partiu o pão”), então seria correto também interromper a Oração Eucarística e dar a comunhão (porque lá diz também “e o deu a seus discípulos”), o que seria, liturgica e pastoralmente, incorreto.
João de Araújo